Sua causa!
Querido aluno!
Seja bem-vindo novamente!
Vamos continuar com o nosso caso jurídico.
José é advogado da Associação de Defesa de Beneficiários de Planos de Saúde de Pernambuco (ADBPP), atuante naquele estado na cidade de Recife há mais de dez anos. José é inscrito na OAB/PE com o número 54321.
A ADBPP foi procurada por diversas pessoas em janeiro de 2022 e todas elas, de forma idêntica, reclamaram que seus planos de saúde passaram por uma grande mudança, sendo a carteira de pessoas mais idosas (todas acima de 55 anos) integralmente assumida por outra empresa e sob a condição de que obrigatoriamente se submetessem a novas cláusulas contratuais para que permanecessem sendo atendidas, sob pena de imediata cessação de todos os benefícios.
Todas essas pessoas eram beneficiárias de planos da empresa "Acém Health" e passaram a compor de forma automática o novo plano "SemHelp", que pertence ao mesmo grupo econômico, mas que conta com uma rede de atendimento muito inferior àquela inicialmente contratada, sem hospitais importantes que constavam da rede anterior e com um diminuto número de médicos, que se encontram exclusivamente nos hospitais próprios do plano, localizados na capital do estado, mesmo tendo o plano a promessa de um amplo atendimento nacional.
Os beneficiários ainda foram obrigados a aderir a um novo contrato em que há uma cláusula de permanência máxima de 15 dias de internação em UTI e carência para utilização dos serviços de assistência médica nas situações de emergência por 90 dias a contar da migração para o "SemHelp".
Essas pessoas são associadas da Associação de Defesa de Beneficiários de Planos de Saúde de Pernambuco (ADBPP), e pediram para que fosse tomada uma medida judicial urgente para que todos fossem protegidos contra essas atitudes da empresa.
Em razão disso, o advogado José ajuizou uma Ação Civil Pública em face das duas empresas de saúde, visando a permanência delas com as exatas condições anteriores e anulando as cláusulas abusivas que a elas foram impostas.
Nessa ação foi pedida a concessão de liminar contra as empresas devido à urgência que a causa envolve, no entanto, o magistrado de primeiro grau entender não ter vislumbrado o "periculum in mora" no caso em concreto, mandando apenas citar as partes para que apresentassem contestação no prazo de 15 dias úteis.
"Não vislumbro a presença do periculum in mora no presente caso, uma vez que as pessoas continuam beneficiadas pelo novo plano de saúde, não havendo nada além de um possível ocorrência de perigo que poderá ser melhor analisado após o exercício de defesa das rés e a dilação probatória. Assim, julgo improcedente o pedido liminar e ordeno a citação das rés para que, querendo, apresentem contestação em 15 dias úteis".
Diante disso, no papel do advogado José, tome a medida processual adequada.
Fundamentando!
A CONSTITUIÇÃO E O DEVIDO PROCESSO LEGAL
O Devido Processo Legal consiste em um princípio muito amplo, considerado por alguns como um superprincípio que engloba diversos outros "subprincípios" de direito de acesso ao Estado Juiz (Poder Judiciário) e da obtenção de um desenvolvimento processual, de acordo com normas previamente estabelecidas, baseadas em um critério justo que possibilite o exercício da persecução de direitos e de ampla defesa pelas partes.
A relação processual é sempre pública, isto é, sempre envolve um indivíduo que aciona (direito de ação) o "Estado Juiz" por meio de um instrumento chamado processo, para que ele dê à parte autora um bem da vida que a outra parte (ré) resiste a entregar de forma espontânea. Essa pretensão resistida recebe o nome de "lide" e a tutela estatal é a forma legitimada pelo Direito para a obtenção de um direito em face de outra pessoa que resiste a essa finalidade.
O devido processo legal é, portanto, a forma desse instrumento legal ser exercido de forma justa e adequada, informado pelos princípios da justiça, com a igualdade, a lealdade e a boafé entre as partes.
A recorribilidade das decisões. O Princípio do Duplo Grau de Jurisdição
A ideia da existência de recursos às decisões judiciais reside dos naturais inconformismos e da falibilidade humana. Como a vontade do juiz - ao exercer a jurisdição - substitui a vontade das partes, é natural o inconformismo da parte perdedora com o que foi decidido.
Como essas decisões são proferidas por pessoas, elas são sujeitas a erros, por isso a revisão delas por outras pessoas é desejável. Essas pessoas, em tese, são mais experientes por possuírem mais tempo de jurisdição e, em regra, compõem um colegiado, isto é, um grupo de pessoas que julga conjuntamente.
O Duplo Grau de Jurisdição não está previsto expressamente no texto da nossa constituição, mas decorre da lógica constitucional. Princípios como esses são chamados de implícitos ou não expressos. Neles, o intérprete extrai do texto a lógica sistêmica que aponta a sua existência, mesmo que não escrita.
No duplo grau, a estrutura do poder judiciário e a distribuição de competências constitucionais para os diversos órgãos judiciais preveem a possibilidade de recursos em todos os níveis, com exceção naquelas causas de competência originária do Supremo Tribunal Federal.
Princípios recursais
Em âmbito infraconstitucional, isto é, abaixo da constituição, as leis preveem diversos princípios relativos aos recursos e estudaremos alguns dos mais importantes para a compreensão da nossa matéria.
Princípio da legalidade
Princípio da legalidade somente as leis e a Constituição podem prever recursos, não havendo a possibilidade de que sejam criados recursos pelas partes.
A Constituição atribuiu à União a competência para legislar sobre o direito processual com exclusividade, assim, há somente recursos que a lei federal taxativamente criou, não podendo a lei estadual ou municipal criar recursos.
Princípio da taxatividade
Como somente há recursos criados por lei, eles constam de um rol legal que é taxativo, isto é, que não pode ser ampliado por analogia, por exemplo.
O Código de Processo Civil apresenta os seguintes recursos:
Art. 994. São cabíveis os seguintes recursos:
I - apelação;
II - agravo de instrumento;
III - agravo interno;
IV - embargos de declaração;
V - recurso ordinário; VI - recurso especial;
VII - recurso extraordinário;
VIII - agravo em recurso especial ou extraordinário;
IX - embargos de divergência. (BRASIL, 2015, [s. p.])
Nos casos em que as decisões judiciais não têm recursos previstos, a doutrina e a jurisprudência entendem que poderá ser impetrado Mandado de Segurança de forma excepcional, em razão de expressa previsão legal (interpretada a contrario senso):
Art. 5º Não se concederá mandado de segurança quando se tratar:
I - de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução;
II - de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo;
III - de decisão judicial transitada em julgado. (BRASIL, 2009, [s. p.])
PONTO DE ATENÇÃO
Súmula nº 267 do STF - "Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição".
Contudo, a medida é excepcional e somente é admitida em situações sensivelmente incorretas, que possam gerar dano irreparável.
Princípio da unirrecorribilidade, singularidade ou unicidade
Há apenas um único recurso cabível para cada espécie de decisão judicial. Essa regra impede a interposição simultânea de recursos pela mesma parte em face da mesma decisão.
No entanto, há uma exceção a essa regra, em decisão do tribunal de segunda instância que, ao mesmo tempo, atinja matéria constitucional (ensejando a interposição de recurso extraordinário ao STF) e matéria legal (ensejando a interposição de recurso especial ao STJ). Nesse caso, é necessário o ingresso com ambos os recursos sob pena de preclusão.
Princípio da fungibilidade
Há casos em que há dúvidas objetivas a respeito de qual o recurso cabível e, caso sejam elas legítimas do ponto de vista jurídico e doutrinário, os tribunais podem receber um de distinta natureza em substituição a outro recurso, por exemplo, um agravo onde caberia uma apelação.
Isso decorre da chamada Instrumentalidade das Formas que releva a forma equivocada (instrumento) priorizando a finalidade buscada pelo legislador, como o amplo exercício da defesa da parte.
A fungibilidade admite a conversão de um recurso em outro, desde que não tenha ocorrido erro crasso ou não tenha havido preclusão do prazo de impugnação, isto é, desde que não tenha sido esgotado o prazo para interposição do recurso correto.
Princípio dispositivo ou da voluntariedade
A parte não é obrigada a recorrer e somente o fará por vontade própria. Esse princípio decorre da inércia da jurisdição. Somente com a demonstração de interesse e legitimidade a parte sucumbente (perdedora em qualquer ponto da ação) pode pedir a reapreciação jurisdicional da matéria.
Contudo, há matérias de interesse público que deverão ser revistas por um órgão superior de forma necessária, denominada de Reexame Necessário ou Remessa Necessária.
Não existe mais o chamado "recurso de ofício" em razão da ausência de tecnicidade desse termo.
PONTO DE ATENÇÃO
O Artigo 496 do Código de Processo Civil:
Artigo 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal. (BRASIL, 2015, [s. p.])
No reexame necessário, o Tribunal de Justiça (ou o Tribunal Regional Federal quando se tratar da Justiça Federal) reexaminará a sentença mesmo sem que a parte tenha recorrido da decisão, podendo reformá-la. Isso decorre do interesse público envolvido.
Princípio Tantum devolutum quantum appellatum
Os recursos não permitem ao tribunal o conhecimento de matéria estranha ao âmbito do julgamento anterior, isto é, o tribunal que julgará o recurso somente poderá julgar aquilo que ficou restringido pela matéria efetivamente impugnada, não podendo julgar toda a causa novamente, quando isso não tiver sido pedido no recurso.
Isso delimita a matéria a ser conhecida em grau de recurso e não atinge àqueles casos em que o interesse público exige a remessa necessária a um grau superior.
Princípio da vedação da reformatio in pejus
O recurso da parte não poderá piorar a sua situação, devendo melhorar ou, pelo menos, manter idêntica a situação anterior do recorrente. Isso não ocorrerá quando ambas as partes recorrerem e quando estiverem em julgamento matérias de ordem pública, que exigem que o juiz conheça de ofício a qualquer tempo ou grau de jurisdição o seu conteúdo, mesmo que em prejuízo do recorrente.
Algumas terminologias necessárias à compreensão da matéria Decisão Singular: é a decisão tomada por um único juiz, chamado de juiz de primeiro grau. São os magistrados que julgam sozinhos em primeira instância.
Decisão Colegiada: são aquelas que são tomadas pelos órgãos colegiados. São eles os Colégios Recursais previstos no sistema dos Juizados Especiais1 e todos os demais tribunais. No âmbito cível, os tribunais de justiça dos estados, os Tribunais Regionais Federais, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal.
Decisões Monocráticas: são decisões realizadas por apenas um magistrado que compõe um órgão colegiado. Nas decisões dos tribunais será sempre sorteado um magistrado denominado relator. Caberá a ele realizar a relatoria do processo a fim de apresentar aos demais julgadores a sua visão a respeito do caso. Caberá a ele a tomada de decisões que podem até mesmo extinguir a ação em casos determinados, de forma monocrática, isto é, sem a participação dos demais julgadores. Há recursos próprios para que a decisão seja reanalisada pelas turmas de julgadores ou pelo colegiado completo.
Juízo a quo e ad quem: a quo significa "o começo", "desde onde". No caso dos recursos significa de onde vem a decisão recorrida, de que órgão judicial provem a decisão.
Já ad quem significa "o juízo" ou "tribunal a quem se destina o conhecimento do recurso".
Interesse recursal: para que a parte recorrente impugne a decisão, é necessário que ela persiga alguma utilidade na interposição do recurso, que seja possível obter um resultado mais vantajoso. Não haverá interesse recursal quando a parte obtiver todos os resultados previstos no seu pedido.
Tempestividade: os recursos devem ser interpostos dentro do prazo fixado na lei. O CPC de 2015 simplificou muito os prazos recursais, prevendo o prazo de 5 dias para embargos de declaração e agravo interno e 15 dias para os demais recursos. Lembre-se que os prazos são contados em dias úteis e há contagem de prazos em dobro para o Ministério Público, Defensorias e Entes Públicos.
Preparo: para a interposição de alguns recursos devem ser recolhidas taxas judiciais que recebem o nome de preparo. Com o recolhimento da taxa deve ser esse comprovado no ato da interposição do recurso. O não recolhimento dessas taxas gera a denominada
1 Os Juizados Especiais são competentes para o julgamento de casos de menor complexidade (e valores menos elevados), ou naqueles crimes de menor potencial ofensivo nos casos de Juizados Especiais Criminais. Possuem procedimentos mais simplificados visando o acesso à Justiça e à celeridade das decisões. Os Juizados Especiais tiveram a suas criações previstas na Constituição Federal de 1988 (art. 98, I) e são regulados pelas das Leis nº 9.099/1995, 10.259/2001 e 12.153/2009.
"deserção". O CPC de 2015 não traz mais a declaração automática de deserção, possibilitando que seja remediada a ausência do preparo, com a intimação da parte para que o recolha no prazo de 5 dias. Nesse caso, se a parte nada pagou, pagará o dobro do valor devido, e se pagou a menos do que o devido, somente deverá complementar os valores. O Ministério Público, Defensorias e Entes Públicos, em regra, são isentos do pagamento de taxas judiciais.
Legitimidade recursal: somente podem recorrer de uma decisão aqueles que possuem legitimidade recursal taxativamente prevista na lei.
PONTO DE ATENÇÃO
Art. 996. O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público, como parte ou como fiscal da ordem jurídica.
Parágrafo único. Cumpre ao terceiro demonstrar a possibilidade de a decisão sobre a relação jurídica submetida à apreciação judicial atingir direito de que se afirme titular ou que possa discutir em juízo como substituto processual. (BRASIL, 2015, [s. p.])
Portanto, somente as partes vencidas, o Ministério Público e o terceiro prejudicado é que possuem essa legitimidade.
PONTO DE ATENÇÃO
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituise em Estado Democrático de Direito e tem como FUNDAMENTOS:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político. (BRASIL, 1988, [s. p.])
Vamos peticionar!
Com este conteúdo estamos prontos para a pratica!
Qual medida processual o Dr. José deverá tomar?
Lembre-se, temos que buscar a solução para o problema do grupo de beneficiários em face da empresa privada de planos de saúde.
Qual é a medida processual cabível?
Feito isso, você deverá:
1) Verificar qual o foro competente para o seu julgamento, a fim de fazer o correto endereçamento da petição.
2) Verificar os documentos necessários para comprovar a legitimidade do autor.
3) Apontar corretamente o polo ativo e polo passivo da sua demanda, observando os fundamentos legais.
4) Demonstrar o cabimento do recurso, com a devida fundamentação legal.
5) Narrar os fatos que embasam a demanda.
6) Enumerar os requerimentos e pedidos.
7) Datar e assinar a petição.
Agora é com você!
Mãos à obra!